Deutsche Welle (DW) – Imigrantes votando ilegalmente, manipulação de votos eletrônicos e por correio – há algum fundo de verdade nisso? Deutsche Welle (DW) avalia alegações que voltaram a circular nas redes a poucos meses da eleição à Casa Branca. A menos de quatro meses para a eleição à Presidência dos Estados Unidos, em 5 de novembro, já circulam alertas na internet sobre possíveis fraudes ao pleito. A DW analisou as quatro narrativas mais recorrentes.
Diversas publicações nas redes sociais alertam que estrangeiros poderiam votar na eleição à Casa Branca – apesar de o direito ao voto em eleições federais, por lei, ser reservado somente a cidadãos americanos.
Uma postagem com mais de 73 milhões de visualizações no X cita um artigo do jornal New York Post ao afirmar que “os escritórios de assistência social em 49 estados estão distribuindo formulários de registro de eleitores a imigrantes ilegais”.
“Estamos para o que é, talvez, a iniciativa de fraude eleitoral mais abrangente na história da política americana”, comentou um na mesma rede social. “Podemos estar diante de uma repetição de 2020.”
Checagem da DW: A história é enganosa.
Congressistas republicanos como o presidente da Câmara dos EUA, Mike Johnson, insistem nessa narrativa, mas não há nenhuma evidência de fraude eleitoral ampla por parte de cidadãos estrangeiros.
A Heritage Foundation, um think tank americano conservador, criou um banco de dados sobre fraude eleitoral e encontrou 24 casos de cidadãos estrangeiros que votaram entre 2003 e 2023.
De fato, estrangeiros até poderiam obter formulários de registro eleitoral nos escritórios de assistência social – não só nesses escritórios, mas em vários outros lugares.
“Formulários de registro de eleitores estão disponíveis em praticamente qualquer lugar nos Estados Unidos, inclusive online”, pontua David Becker, diretor-executivo e fundador do Centro para Inovação em Eleições e Pesquisa (CEIR), uma entidade apartidária e sem fins lucrativos baseada em Washington, capital dos Estados Unidos.
Só que, como ele explica, “cada pessoa nos Estados Unidos que busque se registrar como eleitor precisa apresentar um documento de identificação no ato do registro”. E esses documentos de identificação, segundo ele, permitem saber se alguém é ou não cidadão americano.
“Vários estudos e investigações conduzidas pelo Estado demonstraram que estrangeiros votando em eleições federais e estaduais é algo que praticamente nunca acontece”, constata o Centro Brennan para Justiça da Escola de Direito da Universidade de Nova York. “É ilegal, e se um estrangeiro intencionalmente se registrar ou votar em uma dessas eleições, ele enfrentará multas, prisão e deportação.”
Documento sem foto facilita fraudes?
Alguns posts em redes sociais exigem a obrigatoriedade da apresentação de documento com foto para quem quer votar, e alegam que aqueles que se opõem “à identificação do eleitor querem esconder a fraude, e não resolvê-la”.
Em uma mensagem com 11 milhões de visualizações, o bilionário Elon Musk endossa a narrativa: “Não exigir um documento com foto para votar obviamente torna impossível provar fraude eleitoral. É por isso que a extrema esquerda se recusa a exigir documento com foto para votar.”
Reforçando o argumento de Musk, vários outros posts nas redes exibem uma longa lista de tarefas cotidianas que requerem a apresentação de documento com foto.
Checagem da DW: A informação não procede.
Cada estado americano tem suas próprias regras para identificar o eleitor na hora de votar. A maioria exige a apresentação de algum documento. Pode ser uma identidade, uma carteira de motorista ou passaporte com foto – ou, ainda, um cartão de registro de eleitor, a certidão de nascimento ou o cartão de seguridade social.
Pela lei federal, há também regras especiais para eleitores de primeira viagem que não tenham se registrado pessoalmente ou que não tenham apresentado seus documentos ao se registrarem.
Em 36 dos 50 estados americanos há leis que exigem dos eleitores a apresentação de algum documento de identificação na hora de votar. Os demais 14 estados e o distrito federal em Washington “usam outros métodos para verificar a identidade dos eleitores”, segundo a Conferência Nacional das Legislaturas Estaduais. Um desses métodos é a comparação da assinatura no ato da votação com a do registro de eleitor.
Todos os eleitores, independente do tipo de verificação exigida pelos estados, podem ser processados em caso de fraude.
No caso de alguém tentar se passar por outra pessoa, Becker, do CEIR, pondera que há “controles muito rígidos” e cita uma probabilidade “muito alta” de que o verdadeiro eleitor apareça e tente votar.
Para ele, é descabível comparar o ato de votar sem documento com outras tarefas que requerem a apresentação de documento com foto, como a compra de bebidas alcoólicas, por exemplo.
“O voto é um direito constitucional nos Estados Unidos; comprar álcool, não”, explica. “O direito ao voto está na base de todos os nossos outros direitos. Se impomos barreiras a esse direito, é muito razoável que pessoas de boa-fé dos dois lados [democratas e republicanos] queiram se certificar de que esses obstáculos não vão resultar acidentalmente no impedimento de alguém que pode votar.”
Uma análise recente do Centro para Democracia e Engajamento Cívico da Universidade de Maryland constatou que quase 21 milhões de pessoas aptas a votar não têm carteira de motorista válida. Outras cerca de 29 milhões têm, mas seus endereços residenciais atualizados não constam do documento.
Fraudes em voto pelo correio
Outra narrativa enganosa que circula na internet é a de que o voto por correio precisa ser banido para evitar fraudes. “Quando você olha para a realidade de toda essa votação por correio e as urnas eletrônicas, [é como se] nós realmente estivéssemos pedindo para que a fraude eleitoral aconteça”, afirma um internauta.
Checagem da DW: A informação não procede.
Fraude eleitoral associada a votos enviados por correio é algo extremamente raro, segundo o Centro Brennan para Justiça – “tão raro que diversas análises mostraram que é mais provável alguém ser atingido por um raio do que fraudar um voto”.
Há medidas para evitar que isso aconteça, por exemplo com monitoramento por vídeo de caixas de correio ou equipes de funcionários eleitorais mistas (formadas por republicanos e democratas).
“[Os votos] são verificados na hora que o eleitor solicita a cédula eleitoral, e são verificados de novo no momento em que o eleitor devolve a cédula – muitas vezes conferindo a assinatura ou talvez o número da carteira de motorista”, afirma Becker. “Cada cédula de votação, seja enviada por correio ou outro tipo, está disponível apenas porque um eleitor específico na lista de eleitores a solicitou. Em outras palavras: você não pode simplesmente imprimir cédulas. Elas devem estar vinculadas a um registro de eleitor.”
Votos por correio existem há bastante tempo e são, para o Centro de Políticas Bipartidárias, uma forma de votar segura e “utilizada por eleitores de todos os partidos políticos”. Os registros de eleitores são regularmente verificados, com a exclusão de pessoas que morreram ou se mudaram para outro estado.
Até mesmo o ex-presidente Donald Trump, que ao atribuir sua derrota eleitoral em 2020 a um sistema de votação “manipulado”, agora está a usarem as opções de voto antecipado e por correio.
E quanto às urnas eletrônicas?
A falha na apuração de votos nas primárias que escolheram os candidatos a governador de Porto Rico aumentou a desconfiança sobre as máquinas. Mas a maioria dos eleitores nos EUA não usa a urna eletrônica – ou, quando o faz, geralmente eles têm um backup do voto em papel.
“Só alguns eleitores em estados como Louisiana, Mississippi e Tennessee têm voto puramente digital, onde os votos são realmente contabilizados com base nas seleções feitas em uma tela sensível ao toque”, explica Becker. “Mais de 95% dos americanos votam em cédulas de papel. Essas cédulas de papel são contadas por máquinas, mas podemos recontar e, principalmente, auditar para confirmar que as contagens das máquinas foram precisas.”
Um exemplo disso são as eleições de 2020, com a recontagem manual de cerca de 5 milhões de cédulas na Geórgia após o então presidente Trump alegar fraude. O resultado foi confirmado pelo secretário de Estado da Geórgia após uma “primeira e histórica auditoria estadual”.
“Ninguém está dizendo que as máquinas são perfeitas. Ninguém está dizendo que elas não podem falhar ou que qualquer máquina é impossível de hackear”, ressalta Becker. “É por isso que é realmente importante que tenhamos as auditorias que temos nos Estados Unidos, para confirmar que os resultados das máquinas estão corretos.”
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