A embaixadora dos Estados Unidos no Brasil, Elizabeth Bagley, afirmou à CNN que a emissão de vistos americanos para brasileiros registrou um número recorde em 2023 e deve ter novo aumento em 2024. No ano passado, os consulados americanos carimbaram o passaporte de 1,1 milhão de visitantes do Brasil.
No primeiro semestre deste ano, foram 675 mil vistos — alta de 17% na comparação com o mesmo período de 2023. “Estamos comprometidos em tornar [esse processo] mais rápido e eficiente”, disse a embaixadora, mencionando ações como aumento dos funcionários consulares e renovações de vistos sem a necessidade de entrevistas.
Bagley é a entrevistada desta semana no Vozes da Diplomacia, coluna da CNN que traz entrevistas semanais com representantes da comunidade diplomática no Brasil e no exterior. Ela falou também sobre a crescente rivalidade geopolítica entre EUA e China, deixando claro um ponto: “Não estamos pedindo que o Brasil, ou qualquer outro país, escolha [entre um e outro]”.
Leia os principais trechos da entrevista:
A senhora é representante do presidente Joe Biden, que acaba de lançar a vice-presidente Kamala Harris para sua sucessão na Casa Branca. O que muda para o Brasil se Kamala for eleita ou, caso contrário, se Trump sair vencedor do pleito?
O povo norte-americano elegerá seus líderes em 5 de novembro, em um processo eleitoral com amplo mecanismo de controle para garantir a transparência e a integridade das eleições.
Embora eu certamente tenha minhas preferências para a próxima eleição, como diplomata dos EUA, não é meu papel especular sobre os possíveis resultados. Nosso relacionamento bilateral de 200 anos é baseado em valores democráticos compartilhados, não em qualquer líder político específico.
Os investimentos das empresas norte-americanas no Brasil ultrapassam R$ 1 trilhão, consolidando os EUA como o maior investidor estrangeiro. Esses números históricos demonstram que, independentemente do cenário político, a intensa interação entre nossos povos é um ativo estratégico para ambos os países.
Brasil e EUA avaliam o lançamento de uma nova parceria sobre transição energética às margens da cúpula do G20 em novembro. Em que medida essa parceria pode beneficiar o Brasil? Há como evitar que o Brasil seja um mero exportador de minerais críticos aos EUA, sem nenhum tipo de valor agregado?
Estamos entusiasmados com a proposta do presidente Lula para uma nova parceria para a transição energética. É uma iniciativa que tem o potencial de aprofundar nossa cooperação em energia limpa e avançar nos esforços conjuntos para combater a crise climática.
O Brasil possui um dos perfis energéticos mais limpos do mundo, e podemos trabalhar juntos em tecnologias de ponta, como o sequestro de carbono e o armazenamento de baterias.
Empresas norte-americanas, como a Atlas Lithium e a Energy Fuels, já estão investindo na transição energética do Brasil, e estão bem posicionadas para expandir de maneira responsável e eficiente a indústria de minerais estratégicos do país, graças à sua sólida integração com a crescente cadeia de suprimentos de energia limpa dos EUA.
Dada a experiência, os recursos naturais e a localização, o Brasil deve desempenhar um papel proeminente na cadeia global de suprimentos de energia limpa para expandir fontes alternativas de materiais e tecnologia necessários para a transição energética.
Gostaríamos muito de ver o Brasil produzir baterias, células solares e outros itens que nos ajudarão a manter o aumento da temperatura global abaixo de 1,5 °C.
O crescimento da rivalidade geopolítica entre EUA e China tem feito muitos observadores falarem em uma “guerra fria 2.0”. A senhora acredita que, cedo ou tarde, os países se verão forçados a escolher entre dois modelos distintos ou será possível optar pela neutralidade absoluta?
Gostaria de esclarecer bem essa questão: não estamos pedindo que o Brasil, ou qualquer outro país, escolha entre os EUA e a República Popular da China. Como o presidente Biden disse: “Queremos competição com a China, não conflito”.
Reconhecemos que a China é um parceiro importante para o Brasil. Ao mesmo tempo, os EUA são, de longe, o maior investidor estrangeiro no país: com US$ 228 bilhões investidos aqui, isso é cerca de seis vezes mais do que o que a China investe no Brasil.
A maior parte desses dólares é investida em manufatura, serviços e outros setores que geram empregos. Somos uma democracia que respeita os princípios de livre mercado, o que significa que todos esses bilhões de dólares foram investidos porque as empresas norte-americanas querem estar aqui, não porque o governo as direcionou.
Somos o maior e mais importante mercado para as exportações brasileiras de valor agregado: aviões, equipamentos de engenharia e aço. A maior parte do que os Estados Unidos compram do Brasil não é apenas extraída do solo e colocada em um navio, é construída com as mãos brasileiras.
Qual será o grau de ambição dos EUA no combate ao aquecimento global durante as próximas conferências climáticas, incluindo a COP30, que ocorrerá no Brasil?
Combater a crise climática é um pilar fundamental da parceria histórica entre os governos dos Estados Unidos e do Brasil. Apoiamos fortemente a Presidência brasileira da COP30 e esperamos contribuir para o sucesso da reunião em Belém.
Sob a liderança do presidente Lula, o Brasil reduziu o desmatamento pela metade e continua fazendo avanços nessa área, e esperamos apoiar os esforços do Brasil, inclusive por meio do recém-lançado Pacto pela Transição Ecológica.
Contribuímos com US$ 50 milhões para o Fundo Amazônia em apoio aos esforços de conservação do Brasil, e estamos orgulhosos de que a parceria de US$ 300 milhões da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAID) tenha contribuído para a conservação de mais de 50 milhões de hectares de áreas protegidas a cada ano.
Os EUA estão comprometidos em alcançar um resultado ambicioso na COP-29, em Baku, que ajude a manter a meta de limitar o aquecimento a 1,5 °C ao longo desta década, e esperamos ver o Brasil fazer o mesmo.
Estamos interessados em colaborar com países, empresas e cidadãos para criar prosperidade em uma economia de energia limpa.
Somos pragmáticos e inclusivos quando se trata de tecnologia e estamos prontos para trabalhar com parceiros no avanço das energias renováveis, nuclear, gestão de carbono, descarbonização de combustíveis fósseis e muitas outras soluções.
Há previsão de facilitar o fluxo migratório entre Brasil e EUA, como mais ritmo na análise de vistos?
O processo de visto para os EUA é uma questão relevante para muitos brasileiros que querem visitar nosso país. Estamos comprometidos em torná-lo mais rápido e eficiente. Reconhecemos que o processo pode ser frustrante e que ninguém gosta de preencher formulários ou esperar em filas.
Nos últimos anos, tomamos uma série de medidas para acelerar e melhorar o processo, a fim de atender à demanda histórica de vistos entre os brasileiros, incluindo renovações de vistos sem necessidade de entrevista, aumento do número de funcionários consulares e prioridade para brasileiros que estudam nos EUA.
Essas ações deram resultado. No ano passado, nossos consulados emitiram um número recorde de 1,1 milhão de vistos para brasileiros, o maior número de todos os tempos.
Em 2024, estamos a caminho de bater esse recorde. No primeiro semestre deste ano, emitimos aproximadamente 675 mil vistos, um aumento de 17% em comparação com o mesmo período em 2023.
Esse trabalho é muito importante para nossos países: os 1,6 milhão de brasileiros que visitaram os EUA em 2023 contribuíram com US$ 8,3 bilhões para a nossa economia, e essas visitas sustentam mais de 58 mil empregos nos EUA.
Nossa colaboração com o Brasil também traz grandes benefícios aqui. Até agora, neste ano, mais de 350 mil norte-americanos visitaram o Brasil, gerando uma contribuição de US$ 1,2 bilhão para a economia brasileira.
Após o 8 de janeiro, os EUA e o Brasil reforçaram uma parceria em nome da democracia. De que forma essa data foi vista pelo governo americano e por que ainda há preocupação com essa pauta no Brasil?
Os valores democráticos compartilhados por nossos povos servem como fundamento da relação entre o Brasil e os EUA. Em 2022 e 2023, os brasileiros demonstraram a resiliência de suas instituições democráticas e garantiram uma transferência pacífica de poder.
Na época, os EUA — juntamente com muitos dos parceiros internacionais do Brasil — expressaram a confiança de longa data nas instituições democráticas do país.
Continuamos confiantes na democracia brasileira.
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