Da fotógrafa Claudia Andujar à cantora Carmen Miranda, da ornitologista Emilie Snethlage à chef de cozinha Paola Carosella, da arquiteta Lina Bo Bardi à pintora Tomie Ohtake. Em comum, todas trocaram seus países de origem pelo Brasil, e aqui construíram uma nova vida e carreira de sucesso. Além delas, ao longo da história milhares mulheres saíram de suas terras-natal — por vontade própria ou por questão de sobrevivência — em busca de oportunidades. Cem dessas histórias estão novo volume da série de livros Histórias de ninar para garotas rebeldes, de Elena Favilli, lançado em novembro no Brasil pela Planeta.
“Fiquei chocada quando descobri que a maioria dos refugiados no mundo são mulheres, mas é raro ouvirmos a história da imigração contada pela perspectiva de mulheres”, disse a autora em entrevista à GALILEU. Embora não tenha se incluído no livro, a própria Favilli é uma dessas imigrantes: italiana, trocou Milão pela Califórnia no início da carreira como jornalista para criar a empresa de mídia Garotas Rebeldes, com a qual lançou outros títulos de livros com histórias de mulheres que mudaram o mundo, ainda que nem sempre reconhecidas. “Ser uma garota rebelde depende muito do seu contexto, mas acho que o ponto central é ser uma pessoa que não aceita as limitações que o status quo impõe a você”, diz.
A ideia para fazer a primeira edição temática da série surgiu como uma provocação. “Achei que era importante fazer esse comentário ousado sobre esse tema tão contemporâneo, pois a imigração ainda é uma grande questão”, explica. “Mas basta olhar para as conquistas na ciência e para as contribuições que imigrantes dão para sociedades no mundo todo para entender que a troca de ideias sempre esteve no centro de qualquer avanço na sociedade.”
Uma das histórias emblemáticas da luta por direitos de imigrantes contada no livro é a da ativista Tereza Lee. Nascida no Brasil de pais coreanos, mudou para os Estados Unidos ainda pequena. Na infância, seu pai lhe contou um segredo: eram imigrantes ilegais. Isso a fez viver sob constante medo de ser deportada, e a garota canalizou a energia para a música. Até que, quando um professor a encorajou a entrar na faculdade, Lee contou a ele o segredo. Os dois entraram em contato com um senador que escreveu um projeto de lei que permitiria que ela frequentasse a faculdade.
Outros estudantes que também eram imigrantes ilegais pediram ajuda. O senador apresentou a lei Dream, que busca garantir cidadania a quem chegou aos Estados Unidos ainda na infância. A votação para a aprovação da lei estava marcada para o dia 12 de setembro de 2001. No dia anterior, ataques terroristas interromperam a votação e o sonho de milhares de estudantes — que desde então seguem lutando para buscar a garantia de permanência no país onde cresceram.
“A imigração sempre foi parte da experiência humana ao longo do tempo. E especialmente agora, em que a economia é globalizada e tudo é tão globalizado, o conceito de cidadania deveria evoluir”, opina Favilli. “Nós não podemos ter essa expectativa de poder abrir uma empresa aqui ou ali, investir em ações na China e no Brasil, mas aí dizer que ‘não, não queremos que ninguém do Brasil ou da China ou de onde quer que seja venha para o meu país’. Acho que alguns políticos se contradizem na maneira como lidam com o assunto.”
Na visão da autora, o tema se torna especialmente relevante para as mulheres quando consideramos que uma das principais situações que motivam mulheres a abandonarem seus países é a violência. “É só pensar no que está acontecendo no Afeganistão neste momento”, observa. Um dos exemplos mais recentes incluídos no livro é o da ativista síria Bana Alabed. Nascida em 2009, a garota ficou conhecida mundialmente por tuitar os horrores do cerco da cidade de Aleppo em 2016. Ela e a família acabaram fugindo da Síria para começar uma nova vida na Turquia. Hoje, a garota quer ser professora e trabalhar por um mundo sem guerras.
No livro, há ainda histórias de mulheres que escaparam de conflitos em países como o Vietnã, Camboja, Somália, Etiópia, Bósnia, Iraque e, é claro, da Segunda Guerra Mundial que levou ao Brasil algumas mulheres que se destacaram: a fotógrafa Claudia Andujar, a arquiteta Lina Bo Bardi e a pintora Tomie Ohtake.
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