Uma nova pesquisa descobriu que a reposição de um hormônio melhora o desempenho cognitivo e as conectividades cerebrais de pessoas com Síndrome de Down. Esse é um avanço nunca conquistado antes e, apesar de ser um estudo preliminar, trouxe muita esperança para a Ciência.
O estudo, publicado na Science, foi conduzido por pesquisadores do Laboratório de Neurociência e Cognição da Universidade de Lille, na França, e do Hospital da Universidade de Lausanne, na Suíça.
Os resultados dos testes mostraram que a performance cognitiva aumentou em seis dos sete pacientes, com melhorias na compreensão de instruções, no raciocínio, na atenção e na memória.
As imagens dos exames cerebrais confirmaram as mudanças, revelando uma elevação significativa nas conectividades funcionais do órgão.
“São resultados preliminares, mas nunca houve nada parecido com potencial para melhorar a parte cognitiva da Síndrome de Down. Existem muitas pesquisas, mas é a primeira vez que houve uma descoberta com embasamento científico”, avalia o médico geneticista e diretor do laboratório Genetika, em Curitiba, Salmo Raskin.
Os resultados positivos do estudo podem melhorar o controle de uma síndrome presente em aproximadamente 1 a cada mil nascimentos, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Mudanças no impacto cognitivo
O trabalho teve início com a identificação em modelos animais de que a disfunção do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) estava ligada aos impactos cognitivos da Síndrome de Down.
“Existem vários níveis de comprometimento cognitivo, com quadros mais leves e outros mais graves, mas à medida que eles envelhecem, para todos existe uma piora da cognição basal, com um acúmulo de patologias de fato muito semelhantes aos do Alzheimer”, diz a neurologista da Academia Brasileira de Neurologia (ABN) Sonia Brucki.
“Então qualquer medicação que consiga melhorar a cognição ou ao menos retardar a neurodegeneração é muito bem-vinda, o estudo é um passo bastante importante para isso”, conclui.
Teste clínico
Os pesquisadores desenvolveram um teste clínico piloto com sete homens com Down, de idades entre 20 e 50 anos.
Os participantes receberam uma dose do hormônio GnRH a cada duas horas, durante um período de seis meses, por meio de um dispositivo colocado no braço.
Antes e após o período, foram realizados testes de cognição e de olfato, além de ressonâncias magnéticas cerebrais.
A terapia, no entanto, não teve efeito nas deficiências olfativas dos participantes.
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Fortalecimento da comunicação
Para os pesquisadores, os dados do estudo apontam que o tratamento atua no cérebro por meio do fortalecimento da comunicação entre certas regiões do córtex.
“A manutenção do sistema GnRH parece desempenhar um papel fundamental na maturação do cérebro e nas funções cognitivas”, afirma o diretor de pesquisa do laboratório da Universidade de Lille, Vincent Prévot, um dos autores do estudo, em comunicado.
“Na síndrome de Down, a terapia com GnRH parece promissora, especialmente porque é um tratamento que já existe sem efeitos colaterais significativos”, finaliza.
Avanço promissor
A possibilidade de surgir uma nova terapia direcionada ao comprometimento cognitivo é mais um passo em uma série de avanços que tem permitido alavancar a expectativa de vida de uma população que décadas atrás acreditava-se não crescer além do início da fase adulta.
“Hoje a estimulação cognitiva e a física são muito importantes nas pessoas com a síndrome, são fatores que aumentaram muito a expectativa de vida. Existem outras questões, como problemas cardiológicos, que são altos nessa população, mas que hoje recebem mais atenção. Então nos últimos anos são pessoas que têm tido uma longevidade muito maior — explica Sonia, da ABN.
Os resultados do novo estudo foram promissores, mas o trabalho inicial ainda é apenas uma primeira etapa para que eventualmente a nova terapia seja incorporada na prática clínica.
Os cientistas pretendem agora lançar um novo estudo, em maior escala, para avaliar o tratamento não apenas para um número maior de pessoas com Síndrome de Down, mas também com outras doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer.
“Os mecanismos da perda cognitiva da Síndrome de Down e do Alzheimer são muito semelhantes, então o estudo realmente abre também uma porta para novas pesquisas de tratamento do Alzheimer”, afirma a neurologista.
Com informações do ElPais
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