Após um requerimento negado e cinco meses de espera na justiça, o sargento gay da Polícia Militar de Pernambuco, Valdi Barbosa, de 40 anos, conseguiu aproveitar a licença-paternidade com a filha Sofia e o marido, Rafael Moreira, de 41 anos. Foi a primeira decisão desse tipo na PM do estado.
O pedido foi feito na justiça após o oficial ter o benefício negado administrativamente. Valdi e Rafael tiveram Sofia em junho de 2022 e, na época, o PM teve direito apenas a 20 dias de licença. Vendo a necessidade da família, ele buscou seu direito na justiça.
“Mostrei que minha família existe e preferi não me esconder, porque minha felicidade vale muito mais”, disse o sargento, comemorando a vitória. Valdi e Rafael também mostram a rotina da família nas redes sociais.
Barriga solidária
Sofia é fruto de uma fertilização in vitro com barriga solidária. Foram utilizados óvulos de uma doadora anônima e o sêmen coletado do sargento. A gestação voluntária foi feita pela Rosilene, que é irmã de Valdi.
Cogitar a licença-paternidade além dos 20 dias já oferecidos pela corporação, surgiu quando a ‘barriga solidária’ chegou ao terceiro mês de gestação.
Valdi notou que ele e Rafael – que é professor de inglês online – precisariam de mais tempo em casa para cuidar da bebê.
A busca pela licença-paternidade
Valdi disse que começou todos os trâmites para a solicitação, mas encontrou algumas barreiras pelo caminho.
“Falei com meu superior e ele falou que eu ia ter que entrar com um requerimento administrativo, mas que provavelmente o pedido seria negado, porque não havia nenhum precedente no estado e não havia embasamento jurídico”, explicou o sargento.
Sem desanimar, o pai fez uma longa pesquisa e montou um pedido muito bem argumentado. “Eu fiz o requerimento e inseri vários casos de pais solo que encontrei, inclusive um do Recife. Mas não encontrei nenhum caso de policial militar”, afirmou Valdi.
Mesmo com tanto esforço, Valdi teve um ‘não’, como resposta. O requerimento passou por diversas secretarias da Polícia Militar, seguiu para a Secretaria de Defesa Social e, por fim, foi parar na Procuradoria Geral do Estado, última instância a negar a licença de seis meses.
“Foi aí que eu decidi entrar na Justiça. Primeiro, o estado me concedeu a licença padrão, de 20 dias. Cheguei a trabalhar por dois serviços e depois saiu a sentença. Juntando com férias, fiquei quase oito meses com minha filha”, contou o policial.
Pela família
Valdi é sempre muito enfático quando fala do direito que obteve com a justiça pernambucana.
Ele explicou que, desde o início da batalha judicial, a intenção era buscar o conforto da família.
“O direito não é meu, é da minha filha. Algumas pessoas podem pensar que eu quis um direito que é das mães, mas na verdade o direito é da criança, de ter alguém se dedicando integralmente a ela por seis meses”, afirmou.
Por ser policial, Valdi trabalha num plantão de 24 horas de serviço por 72 horas de folga. Já Rafael, que dá aulas online, tem horários mais irregulares. Eles precisaram criar uma rotina para que Sofia tivesse toda assistência que precisa.
Nos momentos em que folga, Valdi fica responsável pela menina. Rafael assume nos intervalos das aulas. Nos plantões do policial, uma amiga de infância dele fica com Sofia de dia, até que, de noite, Rafael largue.
Sonho de paternidade
Valdir e Rafael estão juntos há 11 anos. O policial sempre comentou com o parceiro a ideia de ter filhos. Já o professor contou que a ideia não foi tão natural.
“Quando eu tinha 20 e poucos anos, tinha muita vontade de ser pai. Depois, as coisas foram mudando e eu desisti, por causa da condição da gente, com medo que a criança sofresse, e por causa de processos meus”, contou Rafael.
“Quando conheci Valdi, ele expressou o desejo e eu esperava que ele desistisse. Parecia algo distante da nossa realidade. Mas ele insistiu, eu embarquei e logo incorporei a ideia e a vontade novamente”, completou.
Rafael conta que todo o processo de ter Sofia foi, para eles, um ato de coragem.
“A gente briga muito por espaços, por direitos, e acho que foi um ato de desbravar mesmo. Era mais fácil dizer ‘a gente não vai ter direito, mesmo’. Mas a gente pensou: ‘pode ser que a gente tenha direito’. Se não tivesse outra forma, contrataríamos uma babá. Seria o jeito. Mas, para a gente, era importante viver cada passo”, afirmou Rafael.
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Redes Sociais
Apesar de todo o trâmite ter acontecido em 2022, a história do Valdi e do Rafael ganhou a internet agora em agosto.
Eles resolveram mostrar mais a família nas redes sociais, também com a intenção de incentivar outros casais homoafetivos a não desistirem do sonho de uma família.
O casal criou o canal Dois Painhos (@somos2pais) logo no início do processo da fertilização in vitro. A primeira rede social criada foi o Instagram e, hoje eles também produzem vídeo para o YouTube.
, Valdi e Rafael decidiram publicar a trajetória no Instagram, com o perfil @somos2pais. O pai professor de inglês, inicialmente, foi contra, com medo do danos que a exposição pudesse causar na vida deles e da filha.
“Fiquei com medo porque a internet é meio terra de ninguém e eu não queria expor minha filha a isso; nem nos expor, porque a gente já está fazendo algo que não é considerado tão normal. Mas o retorno foi muito positivo”, declarou Rafael.
“Tivemos pouquíssimas respostas negativas e muita gente entrou em contato, disse que se inspirou. Algumas outras afirmam que têm filhos gays que pensam que ter filho é muito difícil e que iriam pedir para falar conosco. O feedback tem sido muito bom”, concluiu o pai.
Com informações de g1
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