Transferências de pessoas físicas para EUA, Reino Unido e Bolívia aumentam de janeiro a maio; Europa perde fôlego.
Por Anaïs Fernandes — De São Paulo
21/07/2023 05h00 · Atualizado há 3 horas
As remessas entre pessoas físicas (transferências pessoais) estão no patamar mais alto da série histórica do Banco Central. De janeiro a maio, foram quase US$ 909 milhões, um avanço de cerca de US$ 2 milhões em relação ao mesmo período de 2022, que já havia sido de recuperação após os choques da pandemia. Desde fevereiro, os envios mensais vêm crescendo, passando de US$ 157 milhões para US$ 193 milhões em maio, último dado disponibilizado pelo BC.
“Vimos um aquecimento nos últimos três meses, em torno de 50% para alguns países, de 35% para outros”, diz Alexandre Fialho, diretor da Cotação, empresa do Rendimento. “A queda do dólar abaixo de R$ 5 potencializou esse crescimento”, afirma.
Na pandemia, o dólar se fortaleceu globalmente, em meio à incerteza sanitária, e muitas pessoas no Brasil aproveitaram para repatriar valores, trazendo dinheiro de volta para o país, lembra Jorge Arbex, diretor do Grupo Travelex Confidence. “Hoje, o cenário é bem diferente, porque a taxa de câmbio caiu. Vemos um crescimento dos envios de dinheiro para fora”, afirma.
Levantamento exclusivo da Travelex Confidence, considerando a classificação para operações introduzida pela Nova Lei Cambial, no fim de 2022, mostra que as “doações ou transferências sem contrapartida” – destinadas à manutenção financeira de residentes no exterior, por exemplo – explicam a maior parte das operações no segundo trimestre deste ano. Elas representaram 38% da média do volume total operado, uma aceleração em relação à participação de 33,4% do primeiro trimestre.
“Percebemos aumento das remessas dos próprios brasileiros, que enviam dinheiro para investimentos, comprar imóveis, manter um filho no exterior. Essas pessoas aproveitam o câmbio mais atrativo para mandar uma quantia maior”, diz Eduardo Campos, diretor de câmbio do Banco Daycoval, que oferece o serviço de remessas expressas DayPay.
Registram alta como destino de transferências pessoais do Brasil, em relação ao mesmo período de 2022, a Bolívia (13,4%, para US$ 33 milhões), o Reino Unido (11,7%, para US$ 65 milhões) e os Estados Unidos (7,1%, para US$ 209 milhões). Para alguns países da Europa, como Portugal, Espanha, Itália, França e Alemanha, no entanto, houve queda das remessas.
Apesar disso, na Cotação, Fialho afirma que o fluxo de remessas para Portugal, por exemplo, segue relevante. Considerando apenas as “doações ou transferências sem contrapartida”, o levantamento da Travelex Confidence junto ao BC aponta EUA, Canadá e Portugal como os principais destinos, representando, do volume operado, 25%, 17% e 14%, respectivamente, no segundo trimestre.
Entre abril e maio, a Travelex Confidence observou um aumento de cerca de 40% nas remessas pessoais em geral, com a Bolívia e o Reino Unido também apresentando crescimento próximo disso, segundo Arbex. “Como estamos falando de movimentações entre pessoas físicas, está muito ligado a países onde existe maior fluxo de turistas ou imigrantes no Brasil”, diz. “Percebemos que países como Bolívia e outros mais próximos do Brasil mostram crescimento.”
“Queda do dólar abaixo de R$ 5 potencializou esse crescimento”
— Alexandre Fialho
Além do câmbio favorável, a melhora do mercado de trabalho brasileiro é um fator que ajuda a impulsionar especialmente as remessas de imigrantes para familiares no país de origem, observa Fialho. Em abril (último levantamento do Observatório das Migrações Internacionais – OBMigra), pelo quarto mês seguido, a criação de postos formais de trabalho para imigrantes sustentou crescimento, com quase 3.400 novas vagas.
O valor médio das remessas de pessoas físicas na Cotação é de US$ 1.000 a US$ 1.500, segundo Fialho. No DayCâmbio, serviço de lojas físicas do Daycoval e que acaba sendo bastante usado por imigrantes, o “ticket médio” é mais baixo e concentrado, sobretudo, em africanos (cerca de US$ 80 por envio) e sul-americanos (US$ 200 a US$ 300), segundo Campos. “Esses imigrantes ganham em reais. Com a queda do dólar, principalmente depois de fevereiro, o poder de compra deles aumentou. Então, foi um crescimento mais em função do ‘ticket médio’ em dólar.”
As remessas do Brasil para o Haiti, outro tradicional destino relacionado à imigração, porém, registram queda de cerca de 20% de janeiro a maio de 2023, em relação ao ano passado.
Leonardo Cavalcanti, professor da Universidade de Brasília (UNB) e coordenador do OBMigra, pondera que, pelas informações do BC, os contratos de câmbio identificam os países de origem e destino imediatos dos fluxos. Ou seja, se uma pessoa no Brasil efetua uma transferência para outra no Haiti via uma empresa de remessas que usa um banco intermediário americano, por exemplo, a estatística vai capturar como destino os EUA e não o Haiti.
Apesar da cautela, Cavalcanti aponta que há pesquisas qualitativas observando um movimento de reemigração de haitianos para outros países, conforme mostrou também matéria do Valor.
“Não há como tratar de remessas sem a mobilidade de pessoas. A queda está relacionada à reemigração de haitianos principalmente para os Estados Unidos e o Canadá. Tem a ver também com a situação de desemprego provocada pela pandemia”, diz Handerson Joseph, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pesquisador de dinâmicas de mobilidade dos haitianos. Ele observa que, no caso dos haitianos, por exemplo, mesmo com a melhora recente do mercado de trabalho brasileiro, há marcadores sociais da diferença em jogo na integração, como os raciais.
À frente, a tendência é que o fluxo de transferências pessoais do Brasil para o exterior continue crescendo, segundo representantes do setor de câmbio.
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