Se alguém falasse que era possível descrever características suas com base nos ingredientes de um prato típico da culinária brasileira, qual você escolheria? A estudante Sofia Sarmento Rosa, de 17 anos, escolheu a feijoada, não só para descrever sua personalidade, mas como tema da redação para tentar ingressar em uma das 18 universidades para as quais se inscreveu nos Estados Unidos (leia a redação ao final da reportagem) .
O resultado foi melhor do que ela esperava: a estudante de Brasília foi aprovada em 11 universidades, até esta sexta-feira (24). Sofia ainda espera pela resposta de mais quatro universidades, e não foi aceita em outras três. O sonho é estudar marketing.
“Todo mundo estranha quando falo o tema da redação. ‘Como assim falar de feijoada em redação acadêmica?’ Mas todos que leem ficam surpresos com o desfecho dela”, conta Sofia. Na hora de decidir o tema, Sofia conta que pesquisou e viu que muitos estudantes que buscavam uma vaga no exterior usavam analogias para escrever sobre si mesmos. “Vi uma pessoa que escreveu que a vida era como uma pulseira e os berloques representavam cada característica”, lembra. “Separei minhas características de ser mais ligada à família, gostar da cultura brasileira. Quando pensei, veio a ideia da feijoada. Escrevi em um mês, falando sobre cada ingrediente, fazendo analogias ligada às minhas características”, conta.
Preparo para estudar no exterior
Sofia diz que desde a infância sonha em estudar fora do país. A ideia era fazer intercâmbio no ensino médio, mas o período coincidiu com a pandemia de Covid-19. “Comecei a investir nesse projeto no segundo ano do ensino médio, quando me inscrevi e comecei a estudar para os vestibulares lá de fora, para as provas de proficiência em inglês, esse tipo de coisa”, diz. Sofia se preparou por dois anos. Em 2021 fez o primeiro SAT – Scholastic Assessment Test (traduzido para o português é teste de aptidão escolar), que é o vestibular nos Estados Unidos. O preparo, segundo ela, foi focado mais na prova e deixou a redação para o final.
“Sempre fui muito bem na escola em redação, tirava nota mil no Enem, já fui parabenizada na escola por ser boa, mas nunca escrevi sobre mim”, diz. A adolescente diz que na hora de escolher o tema da redação teve muita dificuldade. “Eu não sabia o que falar. Pensei em escrever assim: ‘Oi, gente, sou a Sofia, vão gostar de mim na universidade de vocês?’”, brinca. Ela, então, começou a pesquisar sobre redações de quem tentou uma vaga nas universidades americanas até encontrar boas inspirações. “Pesquisei sobre aplicação, vi vídeos, consultei. Queria uma coisa autêntica e teve sucesso por isso”. “Eu estava em viagem com a família e recebi um e-mail de ‘Parabéns pela aprovação’. Eu estava na praia e gritei tanto que todo mundo ouviu. Pessoas de outras barracas vieram me dar parabéns. Depois veio aprovação atrás de aprovação. É muito gratificante”, afirma.
Veja versão traduzida da redação
“Feijoada
Em português, feijoada deriva da palavra ‘feijão’ . Brasileiros comem feijão todos os dias, mas feijoada é algo especial. Uma das comidas mais típicas da história brasileira. Crucial para as boas e velhas reuniões de família aos sábados. O cheirinho gostoso de linguiça braseada, a risada da mamãe enquanto eu deixo de sambar, e de ouvir a melhor coisa que qualquer avó pode dizer: A comida está pronta!
Este prato conta muitas histórias, inclusive a minha. Quando o Brasil ainda era um colônia, os escravizados cozinhavam o feijão com a única carne a que tinham acesso, as peças de porco descartadas. Hoje em dia, é fundamental que uma feijoada bem feita tenha esses ingredientes. Eles dão um sabor excepcional e o tornam único. A sensibilidade, pois essas sobras, para muitos, podem ser consideradas inúteis. No entanto, pode adicionar um sabor totalmente novo quando devidamente nutrido.
Por anos eu me culpei por ser muito intensa. Eu pensei que me fazia parecer frágil. Ocasionalmente, sempre que eu tinha uma crise, meu pai – também um pessoa sensível – me aconselhava que chorar nos ajudava a ganhar força e superar qualquer dificuldade. Graças a ele, aprendi a ter orgulho da minha sensibilidade. Faz parte da minha personalidade e não me torna fraca.
Cozinhar a feijoada pode ser considerada uma forma de arte. Não só por todos os ingredientes misturados, mas também pelo processo. Você deve saber quando começar e quando terminar. É normal para uma menina de 15 anos ainda não dominar esta arte.
Meu professor de inglês precisava de ajuda para criar conteúdo de mídia social para vender aulas on-line e eu me ofereci como freelancer consultor e criador de mídia – um nome chique que eu não conhecia na época. Então, eu mergulhei no mundo da publicidade e me apaixonei por ele. Com o apoio do meu professor, comecei a estudar o poder da comunicação verbal e não verbal e a compreender sua importância para os pequenos negócios e negócios globais.
Quando cheguei ao meu último ano, administrar a escola e o trabalho era difícil, mas ainda não sentia ‘aquele cheiro de queimado’. Horários rígidos me ajudaram a terminar minhas tarefas diárias e trabalhar para mais clientes. Mas o sistema educacional brasileiro exige conhecimento avançado de várias disciplinas, o que tornava o trabalho uma tarefa muito mais desafiadora naquele momento. E havia o cheiro. Eu estava cozinhando demais. Eu tive que aprender quando parar e definir limites, assim como na hora da feijoada. Às vezes há muito em seu prato, e eu percebi que você deve priorizar o que é mais vital para si mesmo sem comprometer o verdadeiro sabor da vida.
Uma excelente feijoada deve ter seu tempero – todo tipo de pimenta, louro, cebolinha fresca e alho. Como as pequenas coisas que fazem a vida valer a pena. A felicidade não vem apenas de eventos ou realizações significativas. Claro, esses são incríveis. Mas notar os menores acontecimentos da vida cotidiana não tem preço – o cheiro de terra úmida quando a chuva vem depois de um longo seca, um teste difícil, ouvir sua avó pedir sua refeição favorita.
Assim como o feijão é a base da feijoada, a carne e os temperos formam sua essência. Às vezes, a vida pode trazer à tona o que parece sem importância, mas agora sei que até mesmo um beliscão pode ser fundamental, e aprendi a abraçar cada parte da minha personalidade. Hoje eu entendo o valor de cada ingrediente desse prato, cada pedaço de mim que me faz extraordinária, e estou ansiosa para dizer: A comida está pronta.”
// G1 DF.
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