O número de estudantes sem-teto de escolas públicas de Nova York atingiu um recorde histórico no último ano escolar, atingindo a marca de mais de 119,3 mil, enquanto imigrantes continuam a chegar na cidade após cruzarem a fronteira sul dos EUA com o México.
Apenas no último verão, mais de 30 mil novos estudantes em moradias temporárias ingressaram nas escolas da cidade, incluindo cerca de 12 mil nos últimos 5 meses que não foram incluídos nos números inéditos divulgados nesta quarta-feira.
A estatística, que inclui crianças em abrigos, hotéis, casas de parentes e outros locais transitórios, lança luz sobre os desafios do governo do prefeito Eric Adams para lidar com o aumento dos estudantes que não têm casa. Eles são especialmente vulneráveis, com alto índice de abandono escolar e faltas frequentes. A população de estudantes sem-teto da cidade de Nova York é hoje maior do que todo o sistema público escolar tradicional da Filadélfia.
À medida que o número global de matrículas no sistema diminui, o aumento do número de crianças sem-teto significa que a questão afeta mais escolas. Agora, cerca de 1 a cada 9 estudantes da cidade não tem casa. No entanto, algumas áreas da cidade foram especialmente atingidas. Em uma região do Bronx, mais de 22% dos estudantes estavam sem-teto.
Os números aumentam à medida que a cidade enfrenta uma escassez de habitação e as escolas passam por intensas pressões financeiras. Os problemas ameaçam serviços cruciais para estudantes sem-teto dentro do sistema, que é o maior do país.
“A situação está se tornando mais terrível” declarou em um documento divulgado à imprensa a organização sem fins lucrativos Defensores das Crianças de Nova York, que coleta os dados oficiais há mais de uma década.
O aumento na estatística é composto principalmente por menores imigrantes. Os estudantes poderiam representar um benefício para muitas escolas, ajudando aquelas com matrículas em declínio a evitar cortes orçamentários. Mas várias lideranças escolares, que falaram em condição de anonimato, disseram que o sistema não está fazendo o suficiente para apoiá-los.
Acesso à língua
Um diretor de escola de Manhattan disse que o Departamento de Educação precisa criar um escritório exclusivamente para supervisionar as questões dos imigrantes e coordenar melhor os recursos e as matrículas. Outro diretor se preocupa que alguns adolescentes imigrantes nunca alcancem o nível educacional necessário antes de se formarem. E um diretor do Brooklyn levantou o problema de que estudantes imigrantes com deficiências de aprendizagem não sejam diagnosticados e não recebam a atenção adequada.
A porta-voz do Departamento de Educação, Jenna Lyle, destacou um recente aumento no financiamento para escolas com estudantes sem-teto. — É nossa prioridade contínua fornecer a eles todo o apoio e recursos à nossa disposição — disse ela.
O último recorde para o número de estudantes sem-teto na cidade havia sido de 114,6 mil, no ano letivo entre 2017 e 2018. Mais de 133 mil pessoas fugindo do caos político e econômico chegaram à Nova York desde o ano passado — a maioria composta por famílias com crianças. A cidade contratou cerca de 100 funcionários para ajudar as famílias que vivem em abrigos com as questões escolares. Mas esses trabalhadores estão cada vez mais sobrecarregados e dezenas de novos abrigos de emergência foram abertos recentemente, sem novas contratações do Departamento de Educação.
Para cada cerca de 560 estudantes que aprendem inglês como nova língua, a cidade tem aproximadamente um assistente social bilíngue. Nova York tem cerca de 1,7 mil professores bilíngues fluentes em espanhol e recentemente afrouxou as regras de permanência dos professores em um esforço para aumentar suas fileiras. Algumas escolas com poucos educadores bilíngues contam com o Google Tradutor para remodelar aulas e responder perguntas.
— A primeira coisa que nos chamou atenção foi o acesso à língua — disse Arash Azizzada, que dirige uma pequena organização comunitária que trabalha com famílias afegãs imigrantes — que falam principalmente Farsi e Dari. — A cidade simplesmente não está equipada — afirma.
Crise de saúde mental
Em muitas escolas, os pais se envolveram, doando suprimentos, preparando refeições e reclamando aos representantes eleitos sobre os problemas. Mas há outras necessidades que as famílias não podem resolver. Alguns educadores acreditam que se aproxima uma crise de saúde mental para as crianças migrantes, muitas das quais fizeram viagens perigosas para chegar aos EUA e agora enfrentam isolamento social. Eles temem que as escolas continuem despreparadas para lidar com os traumas.
— Pode-se facilmente reconstruir a ligação entre a escola e a prisão com esta população se não se compreender o que eles estão passado — disse Kevin Dahill-Fuchel, que dirige a organização de proteção da saúde mental Counseling in Schools.
María Marín, que é mãe voluntária, ajudou na escola P.S. 124, no Brooklyn, onde cerca de metade dos estudantes vive em alojamentos temporários. Ela conta que, no ano passado, um menino da Venezuela deixava a sala de aula para se sentar ao lado dela em alguns dias porque estava desconfortável e sentia falta da avó em casa.
— Estamos em um ciclo vicioso. Para que as crianças se sintam seguras e protegidas, elas precisam ver seus pais se sentirem seguros e protegidos — disse ela. Esta semana, do lado de fora do hotel Row NYC, que foi convertido em abrigo, os pais descreveram experiências diferentes com o sistema escolar da cidade.
Cinthya Quiñonez, de 32 anos, disse que foi “super fácil” matricular a filha adolescente, depois de migrar da Venezuela no mês passado. Mas elas partirão na quinta-feira para Utah. A cidade pagou pelos seus voos de ida como parte de um esforço para encorajar os migrantes a partir.
Outras famílias estão estressadas com a escola e o trabalho. Jean Carlos Leal, de 28 anos, e a mulher, foram avisados que, por terem chegado da Venezuela no mês passado, depois de expirado o prazo para pedir uma autorização especial de trabalho, poderiam ser deportados caso a solicitassem. A filha deles é elegível para o programa pré-escolar gratuito da cidade, mas a moradia é um pré-requisito. — Eles nos dizem que precisamos ter um endereço estável para nos inscrevermos — explicou o venezuelano.
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